Participação Direta e Voluntária nos Pecados de Outros
A participação direta e voluntária nos pecados de outros, também conhecida como cooperação no pecado alheio, descreve a cumplicidade na ação má de outrem, configurando uma grave ofensa moral.
Definição do Pecado
O pecado, em sua definição mais geral, é uma palavra, um ato ou um desejo contrário à lei eterna. É uma falta contra a razão, a verdade, a consciência reta e uma falta ao amor verdadeiro para com Deus e para com o próximo. O pecado é uma ofensa a Deus, uma desobediência, uma revolta contra Deus, e resulta de um apego perverso a certos bens. A raiz do pecado está no coração do homem, em sua livre vontade, sendo um abuso da liberdade que Deus dá às pessoas criadas.
A cooperação ao mal é definida como o concurso físico ou moral à ação má de outro. Ela se distingue do escândalo porque o cooperador presta sua obra a uma pessoa que já está determinada a pecar. A participação direta e voluntária nos pecados de outros refere-se especificamente à cooperação formal. A cooperação formal é aquela que, ou pelas intenções de quem coopera ou pela natureza do ato que se cumpre, não se pode realizar sem pecado da vontade. Ela pode ser de dois tipos:
- Subjetiva ou Intencional: Consiste em concorrer ao ato pecaminoso de outro, compartilhando a intenção do mesmo. Por exemplo, votar uma lei a favor da eutanásia ou da fertilização in vitro, concordando com a prática de tais atos.
- Objetiva: Consiste em concorrer ao ato pecaminoso de outro, sem compartilhar sua intenção pecaminosa, mas com um ato que não só ajuda o pecado, mas que não poderia ocorrer em um contexto bom ou indiferente. Trata-se, portanto, de um ato intrinsecamente mau. Um exemplo é um farmacêutico que vende medicamentos abortivos apenas por lucro, sem compartilhar a intenção pecaminosa dos clientes. Outro exemplo é a venda de revistas pornográficas por um dono de banca. A cooperação formal objetiva é intrinsecamente ilícita porque a finalidade intrínseca da obra tem um uso estritamente pecaminoso.
Natureza Teológica
A cooperação formal no pecado alheio é teologicamente grave por envolver um consentimento direto ou indireto com o mal. Ao participar de um ato intrinsecamente mau ou ao compartilhar a intenção pecaminosa de outro, o indivíduo alinha sua vontade com a desordem moral, tornando-se cúmplice da ofensa a Deus e ao próximo.
Consequências Negativas
As consequências negativas da participação direta e voluntária nos pecados de outros são severas, pois a cooperação formal é sempre ilícita e, na maioria dos casos, configura-se como pecado grave:
- Pecado Mortal: A cooperação formal, especialmente quando se colabora para um pecado grave, é sempre pecado grave. O pecado mortal destrói a caridade no coração do homem, desvia o homem de Deus e, se não for recuperado pelo arrependimento e perdão divino, causa a exclusão do Reino de Cristo e a morte eterna no inferno. A principal punição do inferno é a separação eterna de Deus.
- Pecado que Clama ao Céu: Embora a cooperação formal não seja explicitamente listada como um pecado que clama ao céu por si mesma, se o pecado para o qual se coopera for, por exemplo, o homicídio (um crime particularmente grave), então a participação direta nele se enquadra nesta categoria de crimes que clamam ao céu por vingança, devido à sua gravidade intrínseca.
- Perda da Graça Santificante: O pecado mortal acarreta a perda da caridade e a privação da graça santificante, que é a vida divina na alma.
- Prejuízo Irreparável: O pecado, de maneira geral, é um verdadeiro mal e a soma de todos os males. Ele fere a natureza do homem e obscurece a consciência, corrompendo a avaliação concreta do bem e do mal. Alguns efeitos do pecado são irreparáveis, como a vida tirada pelo homicídio, cujas consequências se estendem além da capacidade humana de reparação.
- Dano às Relações Humanas e Sociais: A cooperação no pecado torna os homens cúmplices uns dos outros e faz reinar entre eles a concupiscência, a violência e a injustiça, minando a confiança e a coesão social. Pode levar à formação de estruturas de pecado, que são expressão e efeito dos pecados pessoais, perpetuando o mal em níveis sistêmicos.
- Escândalo: A cooperação pode ser uma forma de escândalo, que é a atitude ou o comportamento que leva outrem a praticar o mal. O escândalo é uma falta grave se, por ação ou omissão, conduzir deliberadamente o outro a uma falta grave, e é particularmente grave quando vem de quem possui autoridade ou dever de ensinar.
Mandamento ou Virtude Ofendida
A participação direta e voluntária nos pecados de outros ofende principalmente:
- A Virtude da Caridade: O pecado é uma falta de verdadeiro amor a Deus e ao próximo. A cooperação formal é sempre ilícita porque inclui o consentimento no pecado alheio. Assim, peca-se não só contra a virtude específica do pecado cometido pelo outro, mas também, e fundamentalmente, contra a caridade, que é o vínculo de toda perfeição.
- A Virtude da Justiça: Muitos atos nos quais há cooperação formal envolvem a violação da justiça, como o roubo, a fraude, a difamação ou a lesão de direitos. O pecado contra a justiça exige reparação, e a cooperação nesse dano moral ou material agrava a falta.
- O Quinto Mandamento ("Não Matarás"): Se a cooperação envolve crimes contra a vida, como o homicídio, infanticídio, fratricídio ou parricídio, ou a cooperação em abortos, ela ofende gravemente este mandamento. Esses atos são intrinsecamente maus e a cooperação neles é igualmente ilícita.
- O Sexto Mandamento ("Não Cometerás Adultério"): Se a cooperação envolve pecados contra a castidade, como a solicitação ou cumplicidade em pecados sexuais, ela ofende este mandamento, que protege a dignidade da sexualidade humana.
- A Lei Eterna e a Lei Divina: O pecado é contrário à lei eterna e representa uma oposição à lei de Deus. A gravidade do pecado é definida pelos Dez Mandamentos e pela Lei Natural, e a cooperação na violação destas leis é uma afronta à vontade divina.
Como Evitar e Remediar
Para evitar a participação direta e voluntária em procedimentos médicos imorais, as fontes indicam um caminho de formação moral sólida, vigilância constante e busca dos sacramentos:
- Formação Moral e Conhecimento da Doutrina: É fundamental que os profissionais de saúde se formem adequadamente no conhecimento dos princípios fundamentais da ética natural e cristã e das diretrizes do Magistério da Igreja. Devem saber quando um produto por sua natureza e na intenção do cliente é indubitavelmente destinado a um fim culpável, não importa sob qual pretexto ou qual solicitação, não podem aceitar de participar. Essa formação permite discernir o que é moralmente lícito.
- Recusa de Participação em Atos Intrinsecamente Maus: O princípio universal é que não é permitido praticar um mal para que dele resulte um bem. A cooperação formal é sempre ilícita. Portanto, o médico, enfermeiro, obstetra ou farmacêutico deve recusar a execução ou a cooperação em atos como esterilizações diretas, abortos, manipulação de embriões para fins não terapêuticos, fecundação artificial ilícita e distribuição de contraceptivos com o fim antiprocreativo.
- Objeção de Consciência: Diante de leis civis injustas que exigem a realização de atos contrários à consciência retamente formada (como esterilizações ou abortos), a objeção de consciência é um recurso legítimo e um dever moral. Os profissionais devem recusar-se absolutamente quando as ações se opõem não apenas à lei da Igreja, mas à própria lei natural, pois a consciência é a norma próxima da moralidade.
- Evitar Ocasiões de Pecado: Os profissionais devem evitar ocasiões próximas de pecado grave. Isso significa evitar situações, ambientes de trabalho ou pressões que levem à tentação ou à colaboração em atos pecaminosos, tomando todas as cautelas necessárias para não consentir às tentações.
- Arrependimento e Propósito de Emenda: Se o pecado foi cometido, é necessária a contrição (dor da alma e detestação do pecado) com a resolução de não mais pecar no futuro. Este propósito deve ser firme e enérgico, indicando uma verdadeira mudança de coração e vontade de não reincidir.
- Sacramento da Reconciliação (Confissão): É o meio ordinário para obter o perdão dos pecados graves. Requer uma acusação sincera e completa de todos os pecados mortais, incluindo suas circunstâncias que mudam a espécie do pecado, para que o confessor possa oferecer a direção espiritual e a penitência adequadas.
- Combater as Más Inclinações e a Concupiscência: A natureza humana está lesada, inclinada ao mal devido ao pecado original. É preciso reprimir todas as nossas perversas inclinações ao pecado. A luta contra a concupiscência (propensão ao mal) é um combate espiritual contínuo que exige vigilância e mortificação.
- Cultivar as Virtudes: A caridade é o maior mandamento social e é fundamental para evitar o pecado, pois nos impulsiona ao amor a Deus e ao próximo, afastando-nos da cumplicidade no mal. É preciso praticar a justiça, dando a cada um o que lhe é devido, e a temperança, que controla os apetites sensíveis e nos ajuda a não ceder a pressões para o mal.
- Buscar a Graça Divina e Oração: A natureza humana é danificada e incapaz de cumprir perfeitamente as demandas morais sem a graça de Deus. A oração é essencial para não entrar em tentação e para ser livrado do mal, pois nos concede a força necessária para resistir ao pecado e suas seduções.
- Educação Adequada: Os pais têm o dever de educar seus filhos sobre a sexualidade e o uso ético dos meios de comunicação de forma nobre e delicada, orientando-os para os valores morais e evitando que aprendam sobre esses assuntos de fontes distorcidas e prejudiciais.
- Ação das Autoridades e Pastores:
- Autoridades Civis: Devem impedir a produção e distribuição de material pornográfico, estabelecer sanções contra a violação dos direitos à reputação e à vida privada, e promover leis e instituições que favoreçam o bem comum e a moralidade pública, protegendo os mais vulneráveis.
- Pastores de Almas: Têm o dever de vigiar para que os instrumentos da comunicação social sejam usados frutuosamente para a evangelização e a formação moral, e de prevenir iniciativas prejudiciais, aconselhando os fiéis sobre os perigos espirituais da leitura, visualização ou apoio a publicações e conteúdos nocivos.
Comentários
Postar um comentário